Ao beber algumas, desandava a rir e a discordar de tudo. Isso às vezes incomodava o cunhado, dono da casa, ao receber sua visita e a de outros convidados. Copo na mão, o contestador defendia furioso suas ideias.
- Alcoólicos Anônimos? Que nada. Antes um bêbado conhecido.
E brindava com o copo onde se lia: Antes embriagado que iludido.
Ao dono da casa aborreciam-lhe tais ideias, geradoras de estridentes e tolas discussões. Um dia chamou o marido de sua irmã às falas.
- Adoro recebê-lo, mas hoje vem visitar-me um padre amigo. Não beberemos enquanto ele aqui estiver, legal? Depois a gente enche o rabo.
Palidez sepulcral tomou conta do cunhado. Foi quando chegou o sacerdote. É apresentado à família, à residência, ao quintal. A tudo e a todos o piedoso presbítero abençoava. De volta à sala, lá encontraram o pobre cunhado, numa abstemia de dar pena. Vindo das trevas, um invisível capetinha sugeriu que perguntassem ao padre se ele aceitaria beber algo.
- Aceito sim, respondeu o bondoso vigário. Como se chama mesmo aquela bebida que vocês fazem com limão, açúcar, gelo e cachaça?
Deu certo o plano do “gabiroto”. O cunhado deu um salto da cadeira, alçando a uma altura que quebraria todos os recordes olímpicos, e berrou:
- Caipirinha, reverendo! É a caipirinha! Vou fazer umas pra gente. Quer um pouco mais forte? Mais limão? Menos açúcar? Vai um gelinho?
O padre bebeu um gole, aprovou estalando a língua, e os três brindaram aos céus.
Lá da etérea plaga, como dizia Camões, Deus olhou complacente suas criaturas. Tolerante como sempre, viu que ainda assim tudo que criara era bom. O Criador balançou a cabeça e foi sorrindo descansar.