Eleições já se faziam em Sabará no século XVIII. A escolha dos reis e rainhas do Rosário ou a escolha dos membros diretores das Irmandades religiosas, representava na verdade a expressão da vontade de um pequeno grupo. No sistema político, as eleições às câmaras municipais se faziam pelo voto censitivo (recenseamento). Votava ou podia ser votado somente aqueles que possuíam renda mínima, terras ou escravos. Isto afinal, levava a ampliação do poder para um grupo ainda mais restrito. Este sistema antidemocrático por excelência, levou ao aparecimento, no século XIX, do corrupto sistema político, o “coronelismo”, isto é, a compra e a venda do voto, como a execrável política do Café com Leite, quando só podia governar o Brasil mineiro ou paulista.
Era a troca de favores entre os poderosos. Esta excrecência política, perdurou até o “getulismo”, já no século XX, e que, infelizmente, ainda pode ser observado em algumas remotas cidades no interior do país. Nos documento de Qualificação de cidadãos votantes, em meados do século XIX, encontramos muitas curiosidades referente ao processo eleitoral. Tínhamos em Minas, em 1854 ( 170 anos), 15 comarcas com 84.071 votantes. Em Sabará, eram 500 votantes, com 16 quarteirões (secções), com renda mínima de 600$000 (seiscentos mil reis, equivalente à mais ou menos 2 mil reais), e que deveriam eleger 12 cidadãos. Em 1868 já eram 363 votantes, o que nos leva a pensar no progressivo empobrecimento da população.
A mulher não tinha direito de votar, restando a ela bordar, cozinhar e costurar. Vale dizer que não era bem assim. Muitas delas não se conformavam com a situação e iam à luta, administrando fazendas, terras, heranças, e até participando de rebeliões e revoluções. Puderam finalmente votar, ao final do século XIX. Bem, na Europa. Porque no Brasil, só aconteceu no início do século XX. Detinham maiores rendas para votarem e serem votados, os médicos, advogados, padres, juízes, ouvidores, boticários, fazendeiros, capitalistas (agiotas), coletores, donos de cartório e de terras de minerar. Os de menor renda, eram os professores, meirinhos, caixeiros, músicos, seleiros, ouríves, sapateiros, marceneiros, artistas, artífices, alfaiates e empregados públicos. Os restantes eram os “desqualificados do voto”, pois suas rendas não atingiam o limite permitido. Estes ficavam, como se dizia, “a ver navios”, quando muito no Rio das Velhas, quando o rio dava val.
A lista dos desqualificados na estatística oficial, é curiosa e às vezes até engraçada mas, é de uma tristeza sem tamanho, visto que, o poder era exercido por uma minoria poderosa economicamente, sobre os pobres cidadãos (se é que se poderia chamá-los assim), humilhados e ofendidos, por muitos que se achavam no direito de julgá-los.
Vejam só o desplante a que se chegava naquele tempo, de ofensas e desvalorização do ser humano.
Citamos aqui para ilustrar nossa fala, algumas definições discriminatórias e humilhantes a que eram submetidos os pobres e desamparados pela vida. E era uma lista oficial do governo, à época. Ah. E o pior, a lista dava nome à todos. Ver para crer, como se diz.
“Não se emprega e é vadio”. “Vive de biscates e caça coelho”. “Não trabalha como sapateiro que é seu ofício e fica o ano todo passeando de casa em casa, ou varrendo igreja”. “É dado a carolices”. “Vive vadeando pelas ruas de Sabará”. “É considerado um verdadeiro réu de polícia”. “Tem casa de jogo proibido”. “É sustentado pelo sogro”. “È um crápula e a Junta lamenta que não tenha ainda sido preso pela polícia e que tenha gente que peça por ele, isentando-o do serviço militar na Guarda Nacional, alegando falta de rendas”. É pedreiro mas muito preguiçoso”. “`Não é casado legalmente”, “É um borrador, e não pintor”. “É alfaiate mas vive doente”. “Tem carta de farmácia mas não tem botica”. “È vadio ou se emprega na pesca”. “`Vive procurando animal no pasto”. E vai por ai. É por isso que todos que podem, devem exercer o seu direito político, de cidadão, de escolher quem vai representá-lo por quatro anos. Direito este, adquirido a muito custo.
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